segunda-feira, 28 de novembro de 2011

Defina implicância

Num círculo de amigos, você está sentado, quietinho, ouvindo música no celular com fones de ouvido. Tem o cuidado de não deixar o volume muito alto para não incomodar os outros. Porque você é muito educado. No entanto, a coleguinha ao seu lado está te olhando fixamente com uma expressão de nojo.
“Sua música está muito alta, eu consigo ouvir daqui.”
Ela fala isso como se dissesse “Meus tímpanos foram violentamente rompidos.”
Você baixa o volume, deixando numa altura segura. Não está conseguindo ouvir direito a própria música, mas não tem problema, contanto que não incomode a amiguinha. Passa algum tempo assim, lutando para entender o que diz a letra.
“Ainda consigo ouvir! Você está surdo? Ouvir música nesse volume!”
Baixa mais um pouco. Afinal, pode mesmo ser perigoso para a sua audição. Um olhar cortante da outra deixa claro que ainda está muito alto, otário.
Mas poxa, algo está errado. Nem dá mais para saber qual é a música que está tocando. Ocorrendo-lhe uma possibilidade, você dá uma pausa na playlist, mas continua com os fones, e pergunta:
“Ainda está alto?”
A menina para por alguns instantes para ouvir, e com um ar aborrecido, declara:
“Está.”

Pois é, amigos, todos nós somos rotulados e rotulamos alguém com uma predefinição de “pessoa chata, ridícula e sem noção”. Isso chama-se implicância. Quando implicamos com alguém, já agimos de uma maneira específica com essa pessoa, sem parar para pensar se está sendo coerente ou não. Às vezes fica meio óbvio, e mesmo que esse alguém esteja certo, ou não fazendo nada de mais, insistimos em confrontá-lo. Por exemplo quando o aspirador de pó quebra e sua mãe pergunta o que você fez com ele. Nem sabia da existência de um aspirador de pó na casa. Quando você diz que já era de se esperar que a Lindsay Lohan estivesse horrorosa naquela roupa, e na verdade era a Emma Stone. “Ah não, a Emma está linda, mas se fosse a Lohan...”
Quando você pede para o amigo do seu lado baixar o volume da porcaria da música, quando na verdade está pausada. é muito comum pagarmos mico por causa de nossa implicância, ou então ficarmos extremamente chatos e intoleráveis, e nos tornamos um Holden Caulfield da vida, se pararmos para pensar demais nos hábitos que nos incomodam demais nas pessoas, marcando-as como idiotas. Não há nada de errado com alguém que resolve tirar a cera do ouvido com as chaves do carro no ponto de ônibus, e isso não é motivo para iniciar uma discussão sobre higiene com o coitado em público. Também não se deve achar que sua irmãzinha não pode jogar no seu novo Nintendo DS, só porque ela destruiu o seu teclado, tacou o seu celular na parede e nesse exato momento está comendo o seu DS. Isso é muita implicância com a pobrezinha, seu insensível. E você também não deve implicar com o Ackley só porque ele mexe nas suas coisas, corta as unhas na sua cama, não escova os dentes, é mentiroso e estoura espinhas sem usar um lenço. Nem chamá-lo de um filho da mãe de um sacana imbecil. Muito menos usar o palavreado do Holden após ler “O Apanhador no Campo de Centeio”. É feio.
Por isso, viva uma vida mais saudável sem se estressar com essas coisas e pessoas, ao invés disso, escreva um texto inserindo todas as suas implicâncias veladamente. Evita conflitos desnecessários.

Entendeu? A segunda fonte mais segura é o dicionário. Dicionários antigos são melhores que os modernos, sem preconceitos. Até a próxima.

Nenhum comentário:

Postar um comentário