quarta-feira, 3 de novembro de 2010

Defina compulsão

Imagine a cena: você está prestes a entrar no metrô lotado. Na hora que as portas se abrem, dispara que nem um doido e começa a empurrar tudo o que vê, disputando com mais meia centena de pessoas um pequeno espaço no trambolho. Mas aí acontece a desgraça. Na pressa de chegar nos assentos, você esbarra em uma das traves com o braço direito. Vou repetir – Você. Esbarra. Na trave.

Pânico, pânico, pânico, pânico. Ao se voltar para o lugar onde tinha esbarrado, percebe que a muvuca já impediu a passagem. E agora sente o mundo girar, suar frio, e um peso enorme no corpo.
Porque esbarrou na trave. Com o braço direito. E não tem mais volta. Mas algo ruim vai acontecer. Algo muito, muito, muito ruim vai acontecer, se você não voltar e esbarrar também o braço esquerdo, para igualar.
É.
Você não leu errado.
E não entendeu do mesmo jeito.
Porque não sabe, ou nunca sentiu na pele o que é uma compulsão. E agora, chegamos ao ponto – defina compulsão.

Compulsão é a urgência que você tem de fazer alguma coisa, desencadeada por algum fato. Uma compulsão pode ser relacionada a um número, uma palavra, um gesto, um pensamento, enfim – em nenhum dos casos é uma coisa boa. Porque isso é um transtorno. TOC – Não, não é “Toque”, é TOC, Transtorno Obsessivo Compulsivo.
Você sabe que tem TOC quando conta seus passos. Quando você arruma as coisas milimetricamente. Quando você gira a chave duas vezes e meia. E acorda pelo menos cinco vezes à noite para verificar se trancou mesmo a porta.
Ou então quando tem a compulsão de fazer as coisas um determinado número de vezes, como por exemplo três vezes. Como por exemplo três vezes. Como por exemplo três vezes.

É como se fosse um ritual. Você TEM que fazer determinada coisa para aliviar uma tensão causada pelo seu cérebro. E a pessoa geralmente não percebe quem tem o TOC até ouvir o relato de outras pessoas.
E quer saber? Eu tenho TOC. E mais de dois terços da população também. Acho quase impossível alguém não ter uma compulsão. Seja arrumar os pregadores de dois em dois no varal, ou arrumar a comida em determinada posição no prato, ou ficar desenhando no copo quando ele está gelado, ou ficar olhando para aquele risquinho de giz que a professora não apagou no quadro, e não descansar enquanto não levantar e apagar por si mesmo.
E o que acontece se a pessoa for impedida de realizar seu “ritual”?
Aaah, meu amigo, aí a porca torce o rabo. Você começa a se sentir ansioso, incomodado, angustiado.
É como o exemplo que eu citei no começo. Um TOC muito comum (inclusive para mim) é o de “igualar” o que se faz com as mãos, braços, pernas, pés, etc. Esbarrou o braço esquerdo, voooolta, e esbarra o direito também. Pisou mais forte com o pé direito, pisa forte com o esquerdo, e por aí vai.
Agora você, leitor saudável, que está rindo da nossa (minha) cara, e não se identificou com nenhum dos casos, e está nos tachando de doidos varridos, maníacos, lunáticos, etc. pode tirar o cavalinho da chuva, porque aposto como também tem uma compulsão. E você também é doente, há. Duvida?
Duvida mesmo?
Mesmo mesmo?
Se ferrou. Porque existe UMA compulsão da qual todos os seres humanos compartilham. Ou seja, nós, compulsivos, estamos em maioria.

Porque todo, qualquer ser humano, criança, velho, adulto, adolescente, homem, mulher, PISA NAS LISTRAS IGUAIS, PRETAS OU BRANCAS QUANDO ANDA NO CALÇADÃO.
Tá vendo?

Você tem uma compulsão.
Hehehe.

Pronto, falei.

Não entendeu AINDA? A segunda fonte mais confiável é o dicionário. Beijos, até a próxima, e procure um médico.

PS.: O TOC tem cura.

PPS.: O TOC tem cura.

PPPS.: O TOC tem cura.

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